segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Dançando no escuro

Estou de olhos fechados desde que nasci. Não sei se por não querer enxergar ou se são meus olhos que vêm luz demais. Luz demais, pra quem não vê, pode parecer escuridão.

Não que seja bom ou ruim, só é diferente, é um outro ponto de vista.

Tenho deixado a música me levar; as vezes danço sozinha, as vezes alguém me guia, outras vezes só esbarram em mim, mas mesmo assim, qualquer toque já me faz mudar de movimento. Com os olhos fechados abro outros tipo de percepções.

Com os olhos fechados eu sinto. Quando sinto, o que vejo é o de menos.

Vez ou outra, confesso, abro os olhos, mas é coisa rápida, não aguento muito não, o que sinto de olhos fechados é bem maior e melhor do que o que vejo de olhos abertos, vejo em quase tudo uma grande podridão.

Outro dia eu estava dançando de olhos fechados, sozinha, e alguém tocou a minha mão: "Por que não abre os olhos para dançar?", de olhos fechados respondi "Hoje eu só quero dançar! Não se incomode com meus olhos não, chegue mais perto que vou conseguir te enxerga. O que você realmente é eu só consigo enxergar assim, no silêncio dos olhos, o que você realmente quer, só entendo na cegueira do que falamos e na clareza da escuridão é onde encontro a certeza de onde eu posso pisar."

Silenciosos, cegos e claros da escuridão, dançamos. Se ele fechou ou não os olhos não sei dizer, mas naquela dança nós escutamos o que não nos cabia falar. Até que a música acabou. E lá estava eu, mais uma vez, sozinha, dançando no escuro.

Não sei quanto tempo passou, não sei o que aconteceu, continuei de olhos fechados, vivendo do que sinto, me movendo de acordo com o que me toca, dando o máximo de mim para que os outros possam enxergar sem ter o perigo de se convencer que apenas aquilo que sentem não é o suficiente para guiar alguém na escuridão. Só sei que depois daquela primeira dança, de tempos em tempos, existe alguém que sempre me tira para dançar, sem perguntar nada, sem querer abrir os meus olhos, apenas silenciando nossa cegueira na clareza da escuridão. Não saberia afirmar, também, se os seus olhos estão abertos, se esta pessoa está sempre me observando de perto, só sei que vez ou outra, danço do jeito que gosto, acompanhada, no escuro, com o sentimento justificando qualquer razão.

Confiar ao ser guiado de olhos fechados é estar pronto para abrir os olhos sem desconfiar!
É preciso um poço de amor e compaixão para não cegar-se nessa realidade de escuridão.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Palavras de esperança


"Troco aqui palavras de esperança! Pegue uma caneta, pegue um papel e dê o seu melhor. Então, coloque o seu papel na caixa e pegue uma esperança para você. Depois de ler: você pode pega-la para você, devolve-la na caixa ou dar o papel para alguém. Muito obrigada e ame sem limites!"

Armada de papéis, caneta e um apelo de esperança, sentei em uma praça de DC.

Desde o princípio eu tava achando que essa experiência seria bem mais interessante pra mim do que para os que possivelmente participariam. Devo confessar que o choque cultural para alguém que era acostumado a viver em meio a tanta arte e simplicidade está sendo cruel! Hehehehehe... Sabe aquele negócio de não saber se abraça, aperta a mão ou beija no rosto?

Essa semana que passou eu tava mesmo era querendo colo, mas sem coragem de pedir.

Tive uma conversa séria comigo mesma e sempre que isso acontece é mais um tapa na cara da sociedade: uma sessão de fotos, um poster na rua, um post novo ou algum desenho. Acho que minha mãe já desistiu de ter uma filha normal. Hehehehe... Mas isso é bom! Na vida a gente sempre tem duas opções, curtir a tristeza ou transforma-la em esperança. Confesso que curti a tristeza uns dois dias, pensando groselha e sentindo saudades, mas nunca se sabe quantos dias a vida ainda têm, então resolvi transformar o que estava entalado.

Assim que sentei, tive a leve impressão de que eu teria de ficar um bom tempo esperando até que alguém resolvesse trocar algumas palavras. Muita gente leu a placa, muita mesmo. Eu parecia um ET, parecia uma hippie louca perdida na concret jungle, mas eu juro que não me importo, achei foi engraçado, é interessante estar nessa posição, de ET, e ver de camarote a reação das pessoas quando a o apelo não é por dinheiro, mas por uma palavra de esperança. Algumas pessoas sorriam, outras olhavam e comentavam com a pessoa do lado, outras ficavam bravas, outras não olhavam nem pros lados, outras paravam e comprimentavam de longe.

Eu já tinha a experiência dos Abraços Grátis que dei no Brasil, o que ajudou muito a manter a minha cara de pau. Fui preparada para voltar para casa com uma caixa cheia de esperança ou apenas com os 3 papéis que eu mesma depositei lá. Fiquei uma hora sentada. Pensei em tudo. Tá! Tudo é muito. Pensei em bastante coisa. Pensei em como isso seria diferente no Brasil, pensei em como estava sendo grande pra mim ficar lá só olhando, pensei em como não ter ninguém para trocar com você te força a tirar esperanças de onde você nunca imaginou ter. Pensei muito mas também senti. Senti que apesar dos pesares, alguns sorriram. Pensei que enquanto eu não trocasse ao menos uma palavra com um desconhecido eu não sairia de lá, ou se tivesse de ir embora para trabalhar, voltaria no dia seguinte. Então pensei e senti por todos que não tem um minuto para alimentar coisas boas mas conseguem reclamar da vida 60 vezes dentro de um minuto.

Meu sorriso estava escancarado e minha liberdade no maior nível possível. Como eu queria ter escrito tudo aquilo na teste desde o momento em que comecei a ficar triste de tantas saudades e falta de amor.

Então olhei no relógio e precisava sair em 10 minutos, mas eu estava renovada e cheia de energia. Estava tranquila. Entendi que, mais do que nunca, eu precisava me reabastecer de esperança diariamente para poder alimentar os outros. Isso é fácil pra mim levando em consideração todos os que já encontrei no meu caminho, os abraços que dei, as conversas que tive, o que aprendi. Eu já estava bem,mas foram nos meus últimos 5 minutos de hippie anarquista que um pai se aproximou com sua filha e perguntou a ela "Quer escrever alguma coisa?", então ambos armaram-se de papel e caneta:

"Hope is strong in cats - they are always hoping for the mouse to run along."
"A esperança é forte nos gatos - eles estão sempre esperando um rato para correr atrás."

"I hope we can abandon religious fundamentalism, greed, ignorance, war, and racism. Oh, and know when we're being lied too."
" Eu espero que possamos abandonar o fundamentalismo religioso, a ganância, a ignorância, a guerra, e o racismo. Oh, e que saibamos quando estamos sendo enagandos também."

Não poderia ter sido em melhor hora. Eu não era a única que estava de cara com a situação em que o mundo está e aquela criança não poderia ter escrito algo melhor. Somos todos gatos, mas não é por que não vemos um rato que desistimos de matar nossa fome.

Então, eles leram cada um sua esperança e fomos embora depois de trocarmos sorrisos.

Eu tive que ficar forte por 55 minutos para entender tudo isso e fiquei feliz por minha persistência. A vida continuou a mesma, os EUA continua um país onde o dinheiro e o materialismo é, na maioria das vezes, prioridade, meus abraços continuam nos meus braços prontos para abraçar quando eu voltar pra casa.
Mas a minha luta é muito maior do que mudar o mundo, minha luta é alimentar o que ainda resta de amor para ele crescer forte e tomar conta do mundo. Não importa o quão louca, o quão fora da realidade ou o quão sem sentido eu possa parecer. Enquanto a minha esperança me fizer levantar da cama vou distribuí-la por onde eu andar, a vida é curta demais para se entristecer e longa demais para acharmos que nossas atitudes não faram diferença nenhuma.

Ame, mas ame sem limites!
Viva, mas viva intensamente!
Seja, mas seja o que se é!
Tema, mas tema para superar!
Sonhe, mas acorde para realizar!